domingo, 18 de outubro de 2009

Desmundo

Escrito por Ana Miranda e adaptado para o cinema pelas mãos do cineasta Alain Fresnot. Ainda não tive oportunidade para Le o livro, mas o filme Desmundo é diferente de todos os filmes sobre Brasil colônia, onde a história é glorificada e embelezada. Fresnot procura mostrar o que provavelmente acontecia na época do Brasil Colonial. Percebi também uma preocupação em restituir, ou pelo menos se aproximar, aquela que teria sido a experiência de língua falada pelos habitantes daquela época, o português arcaico; incluindo falas em línguas indígenas e africanas. Para se entender alguma coisa do que é falado no filme, e necessário recorrer ao uso da legenda.

A narrativa fílmica inicia-se com um fragmento de uma carta de 1552, enviado pelo Padre Manuel da Nóbrega ao Rei D. João, solicitando órfãs do Reino para se casarem com os homens brancos da terra a fim de diminuir os “pecados da terra”, ou seja, uma tentativa de minimizar o número de filhos dos portugueses com as índias . Sob este tema se construiu a idéia do filme. O foco central do roteiro destaca o choque entre Oribela, órfã portuguesa de 16 anos, religiosa fervorosa educada em um convento e Francisco de Albuquerque, um degredado português que enriqueceu com as terras e escravos que adquiriu por aqui. Oribela, apavorada diante do mundo - “desmundo”, “não-mundo” ou fim de mundo - que não compreende e tenta, sempre que pode, fugir e voltar a Portugal. Com esse intuito se envolve com Ximeno Dias, mercador espanhol, cristão-novo. Oribela tentou fugir algumas vezes, e descobriu que o único lugar onde podia se esconder, neste mundo tão grande, era dentro dela mesmo. E que só podia contar com sua lucidez, e, às vezes, nem com isso.

O melhor de Desmundo são as imagens excepcionais dos índios sendo explorados, o tratamento escravocrata dado às mulheres, os mecanismos de escambo, o clima sombrio das primeiras vilas, a língua, a paisagem, as moradias, a alimentação, as referências à antropofagia entre os índios e o comportamento "carinhoso" de nossos catequizadores. Vale observar também as mulheres, tanto o seu conhecimento acerca do corpo e seus hábitos quanto à relação homem-mulher.

É necessário assistir, saboreando cada detalhe e diferentemente das histórias contadas por Hollywood, Desmundo tem um ritmo lento, que não glorifica nem embeleza a história, mas que remete o expectador a sintonizar-se e a problematizar uma série de questões que configuraram o início do processo civilizatório brasileiro, possibilitando, apesar da artificialidade cênica, uma reflexão para afastar um deslumbramento ingênuo que faz parte do imaginário contemporâneo à cerca deste período histórico.










Nenhum comentário:

Postar um comentário