quinta-feira, 12 de novembro de 2009

A Rainha Maria Luísa de Parma segundo Goya


O Retrato de Maria Luísa de Parma é uma pintura concebida a óleo sobre tela em 1789 por Francisco de Goya, retratando a rainha D. Maria Luísa de Parma, mãe da rainha portuguesa D. Carlota Joaquina de Bourbon.
Maria Luísa surge trajando a moda da época, ao contrário dos anos posteriores em que viria a surgir em trajes de maja, o típico traje tradicional espanhol. Nesta tela o neoclassicismo dos primeiros anos de Goya é evidente, realçando os seus tradicionais fundos simples em tons oliva, destacando a personalidade retratada. O maior foco de luz na tela, incide, não sobre o rosto, mas sobre o peito de Maria Luísa.
Nenhuma outra consorte espanhola foi tão odiada, acusada ou abusada como a moralmente corrupta Maria Luisa. Teve numerosos amantes enquanto seu marido se ocupava em armar e desarmar relógios. O mais famoso dos amantes, foi Manuel Godoy apelidado “El Choricero”, chegou a ser Príncipe da Paz, serviu como Primeiro Ministro por anos. Sua paixão pelo jovem Manuel foi a causa dos vários problemas da Espanha da década de 1790 à primeira década do XIX.
Enquanto Maria Luísa governava, porque tinha um genio forte e dominava seu marido o rei, a Espanha foi presa fácil das forças de Napoleão.
Apesar disto, Maria Luísa de Parma educou os seus filhos e casou, juntamente com o marido, a sua filha primogénita, Carlota Joaquina de Bourbon com o infante João, futuro João VI de Portugal, em 1785.
Diz-se que aos 40 anos, quando já não tinha dentes, usava pérolas no lugar deles

Sombras de Goya


Francisco de Goya é um artista que sempre me agradou mais pela sua fase rococó e no romantismo, muito pelo uso das cores e suavidade nos retratos. Quando via os desenhos feitos em litografia me chocavam pela ironia e agressividade. Depois de assistir ao filme, Sombras de Goya e pesquisar sobre o contexto histórico das gravuras, pude perceber a grandeza de um artista, que usou a sua arte como meio de expressar a sua raiva e indignação num mundo turbulento, onde ninguém esta totalmente isento de ser atingido.

O Guarda Sol, 1777 - Goya



O Duque de Osuna e sua família, 1788 – Goya
Graças à amizade que travou com os duques de Osuna, Goya iniciou sua ascensão na corte. Este quadro mostra o profundo carinho que o pintor sentia por seus protetores e seus filhos.



A Galinha Cega, 1788 – Goya.
Originalmente chamada A Brincadeira da colher, essa obra tem notável dinamismo aliado á perfeita representação dos movimentos e posturas.

Sombras de Goya é um bom filme é uma ótima história, um exemplo clássico. Não é a biografia do pintor espanhol Francisco Goya, mas o relato de uma época importantíssima no contexto histórico. Contexto este que é narrado com estrema sensibilidade e poesia trágica, no qual Goya assiste a tudo e registra na sua arte.
A história se passa em 1792, na Espanha, quando o pintor Francisco José de Goya y Lucientes era o artista mais famoso do país, cuja carreira evoluiu de simples desenhista de tapeçarias para pintor oficial da Família Real. Contratado por reis, burgueses e pela Igreja para registrá-los para a posteridade, o artista levava uma vida de privilégios - mesmo manifestando-se contra a mesma Igreja que o contratava. Mas os tempos são difíceis e a Inquisição Espanhola, age de forma implacável; sendo uma corte religiosa, era operada por autoridades da igreja. Porém se uma pessoa fosse considerada herege, a punição era entregue às autoridades seculares, pois "a igreja não derramava sangue". A tortura freqüentemente era usada como modo de penitência. As punições variavam: da mais comum (quase 80% dos casos), que era a vergonha pública (obrigar o uso do sambenito, uma roupa de penitente, usar máscaras de metal com formas de burro, usar mordaças) até ser queimado em praça pública, quando o crime era mais grave. A morte pelo garrote (estrangulamento) era usada para os arrependidos, como é mostrada no filme. Essas punições eram feitas em cerimônias públicas, chamadas autos-de-fé, que aconteciam uma vez por ano na maioria dos casos. Algumas pessoas acusavam outras por vingança, ou para obter recompensas da Coroa. A própria Coroa Espanhola beneficiava-se, ao desapropriar os bens dos conversos. Na espanha em particular, a inquisicao foi especifica em alguns aspectos: como era um tribunal eclesiástico, mas tinha poderes, que lhe eram conferidos pela autoridade real, que desde Fernando e Isabel (os reis católicos do século XV) acreditavam que a Inquisição espanhola seria um instrumento na política da chamada “limpeza de sangue”, contra os descendentes de judeus e de mulçumanos convertidos. Esta Inquisição foi o resultado da Reconquista da Espanha das mãos dos muçulmanos, e da política de conversão de judeus e muçulmanos espanhóis ao catolicismo.


Inquisição, 1815 – Goya

Algumas cenas do filme foram extraídas diretamente dos trabalhos políticos de Goya e recriadas com enorme beleza sombria pelo diretor de fotografia; ele inspirou-se especificamente na serie de gravuras “Los Caprichos”. Nessa série, Goya investe contra o poder detido pelos monges, pelo clero e pelos inquisidores, que via como símbolos do mais puro ódio, revelando-se assim um firme defensor do Iluminismo. Uma razão provável para a revolta de Goya seria o fato de a Igreja incentivar a superstição, perseguindo e condenando supostas bruxas e feiticeiras, e acabando, por dessa forma, afirmar a existência das mesmas. Desta serie, pertencem estas gravuras:



Desenhos para a serie Os Caprichos,1797-1798, giz









Estilo Goya
Goya foi um pintor eclético, que partindo do rococó, se entrega à cor com fúria e liberdade e vai sucessivamente descobrindo a beleza dos cinzentos e dos pretos, sem com isso renunciar às cores intensas. Percorre o neoclassicismo de fins do século XVIII e se apropria do romantismo quando na exaltação da cor. Sua produção é de uma extraordinária abundância, originalidade e vai se diversificando à medida que muda sua maneira de perceber o mundo. Nas obras de Goya identificamos impulsos e maneiras de executar que vão posteriormente constituir princípios de diversos desenvolvimentos importantes da história da pintura nos séculos XIX e XX. Pela técnica pictórica dos seus últimos anos, em que usa a justaposição de pinceladas de cores puras para formar novas cores e delimitar os contornos; assim os impressionistas reconhecem-no como um precursor. A deformação da realidade, tão significativa nas suas gravuras, é nitidamente expressionista. E tem em comum com os surrealistas as visões fantásticas e oníricas que povoam a sua excepcional obra gráfica.
A partir de certa altura, Goya começa a padecer de uma doença que lhe provoca uma surdez progressiva. Começa então a isolar-se. Deixa de ver, como acontecera com os cartões, o lado agradável da humanidade, fixa-se nos seus defeitos, nos seus aspectos grotescos.

Sombras de Goya também merece aplausos por familiarizar a platéia com algumas das grandes obras da época. Não apenas as de Goya, mas também as de outros pintores importantes como O Jardim das Delícias de Bosch e As Meninas de Velásquez. E uma das melhores seqüências do filme mostra passo-a-passo o processo de confecção de uma gravura.


Os Fuzilamentos do Três de Maio de 1808, 1814 – Goya
Em 2 de maio de 1808, os habitantes de Madrid se lançam contra o ocupante francês: duas semanas antes, um golpe de Estado expulsara o Primeiro Ministro Godoy. O oportunista arrastara o país a uma aliança com a França, contra a Inglaterra, provocando a ruina do país, a perda da frota e das colônas na América, e facilitado a ocupação pelas tropas de Napoleão. Caindo Godoy, Carlos IV abdicou em favor do filho Fernando. Mas Napoleão tinha idéia de entregar o trono espanhol a seu irmão alcoólatra, José. O povo de Madrid, atacou as tropas de Murat ( general frances) que reagiu com brutalidade. A repressão foi impiedosa, como mostrou Goya em quadros e gravuras de célebre realismo. Mas as execuções sumárias, a pilhagem, as violações pelo exército francês não impediram a revolta de se estender pelo país. Numerosos exércitos franceses são liquidados por esta guerra de independência de gênero desconhecido. Inventou-se a expressão guerilla (pequena guerra, em espanhol) para qualificar os ataques tipo surpresa de combatentes ocultos que deixavam pouca oportunidade aos grupos de soldados isolados. Napoleão exilou a família real espanhola na França enquanto o alcoólatra José Bonaparte servia como rei da Espanha até que um levante popular o forçou a fugir. Ninguém captou melhor o sentimento de ódio e de vingança pelas humilhações sofridas pela gente de Madri naquela ocasião como Goya o fez numa série de 82 estampas denominadas de Los desastres de La guerra (1810-1820). Durante o governo de Napoleão Bonaparte a Inquisição foi suspensa na Espanha, porém foi reinstalada quando Fernando VII de Espanha subiu ao trono.
Embora o seu sustento continuasse a depender da pintura de retratos dos membros da sociedade espanhola e de figuras francesas, é na guerra que Goya vai encontrar o seu tema preferido, sobretudo na guerra de resistência dos espanhóis contra os soldados de Napoleão, que se caracteriza por uma explosão de ódio e crueldade numa escala sem precedentes na história militar da Europa É importante mencionar a forma inovadora como Goya representa a guerra, afastando-se da visão de palco de grandeza e de honra com que outros artistas da época a representavam. Talvez por enxergar na guerra não só a heróica vitoria, mas a cruel derrota dos homens.


Grande Hazaña! Com mortos!, 1810 - da coleção Os Desastres da Guerra de Goya


Eles são feras!, 1810 – da coleção Os Desastres da Guerra de Goya

Rostos atormentados
Em muitas de suas telas é comum perceber fisionomias de traços exagerados e contorcidos. Goya buscava exacerbar expressões de aflição e agonia em seus personagens, de maneira a transmitir tanto os sentimentos do povo espanhol, traumatizado pelas guerras, quanto os seus próprios, já que estava abalado por grandes sofrimentos causados tanto pela doença quanto pela perda de amigos e parentes.

Que sacrifício, 1799 – da coleção Os Caprichos de Goya

Os quadros mais conhecidos

Oferecidas ao rei Fernando IV, sucessor de Carlos IV, as obras "O Dois de Maio de 1808" e "Os Fuzilamentos do Três de Maio de 1808" (ambas de 1814) retratam uma batalha entre civis e membros da tropa de Napoleão, que aconteceu no dia dois, e a represália dos franceses, no dia seguinte. Já "A Maja Desnuda" (1800) e "A Maja Vestida" (1800/05) trazem a mesma personagem em posição provocante, primeira totalmente nua, e depois vestida com uma sensual camisola colada ao corpo.


La Maya desnuda, 1800 – Goya


A Família de Carlos IV, Madrid, 1800- Museu Del Prado.
Retrato da família real espanhola, onde, por um lado, Goya não favorece os seus modelos, retratando um grupo pouco atraente, e, por outro lado, inclui a sua figura a posar em fundo, já não como humilde servo, mas antes numa postura de autoconfiança

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Camille Claudel - Arte, paixão e loucura




Desde que vi o filme e depois as suas obras, tive vontade de escrever sobre ela. Sua história é surpreendente, vendo suas obras fiquei pensando como ela pode ter sido negligenciada durante quase um século. Ela conseguia esculpir a ternura e a melancolia feminina. Embora possam dar uma interpretação autobiográfica a algumas de suas obras, como "A Idade Madura", onde se vê uma mulher velha arrancando um homem de uma jovem ajoelhada que estende os braços como se estivesse implorando, pode-se também apreciar nelas o movimento, a forte expressão de cada gesto e de cada rosto e as curvas e os detalhes dos músculos que perturbam a razão, lembrando a "art nouveau" da Belle Epoque, período no qual ela viveu durante o exercício de sua arte.



A Valsa

A Idade Madura

Nascida em 1864, é mais conhecida por sua vida atribulada que por seu trabalho. Para o desespero da mãe e orgulho do pai, Camille descobriu cedo o gosto pela escultura. Começou moldando argila, quase como uma brincadeira. Eram figuras inspiradas em Napoleão, Davi e Golias, além de membros da família. Na adolescência, um de seus professores foi o escultor Alfred Boucher. Foi ele que sugeriu ao pai de Camille, Luis-Prosper Claudel, que levasse a menina a Paris, onde ela poderia participar de grandes salões de arte e conhecer a nata intelectual e artística da época. Mas em Paris as dificuldades eram enormes para uma jovem artista. A escultura, além de ser uma atividade prioritariamente masculina, exigia materiais caríssimos como o mármore e o bronze. E mais: era preciso pagar um espaço relativamente amplo – os aluguéis em Paris, já naquela época estavam entre os mais caros do mundo – e o salário do trabalho de fundidores, Camille alugou um ateliê com mais três jovens artistas, Elas dividiam tambem os pagamentos para o professor Alfred Boucher, que as orientava de vez em quando. Foi numa dessas visitas que Boucher apresentou o trabalho de Camille para Paul Dubois, diretor da Escola Nacional de Belas-Artes. Dubois notou a semelhança da obra da jovem com a de outro artista, que começava a despontar para a fama. “A senhorita já teve aulas com Auguste Rodin?” Camille nunca tinha ouvido falar no sujeito.
Aos 19 anos, conhece Auguste Rodin, 24 anos mais velho que ela, escultor já consagrado, que se torna seu mestre e amante. A partir daí, seus destinos estariam para sempre entrelaçados
“Na época, Rodin ainda não era famoso, mas já iniciara a experimentação conceitual e estilística que viria a caracterizar sua forma inusual de esculpir. Por isso, era odiado pelos críticos e amado pela vanguarda de Paris, ou seja, os impressionistas”, diz Jacques Vilain, historiador do Museu Rodin. Se Camille ficou curiosa para conhecer o tal que esculpia igual a ela, esse sentimento durou pouco. “Apenas algumas semanas depois, Boucher viajou à Itália e pediu para um amigo assumir suas aulas particulares. Assim, numa tarde de maio de 1883, Rodin batia às portas das jovens escultoras”, diz Vilain.
Rodin teria entrado cheio de si no ateliê e não fez um só elogio sobre as obras expostas. Muito pelo contrário: apontou defeitos.
Mas ele gostou do que viu. Tanto que passou a freqüentar o local e, depois de dois anos, chamou Camille para trabalhar com ele. O convite coincidiu com um momento particularmente importante na carreira de Rodin. “Ele acabara de receber uma encomenda do governo francês para fazer As Portas do Inferno e Os Burgueses de Calais, obras de grande porte que precisariam de ajudantes para ser feitas”, afirma Vilain.
“Camille era uma artesã habilidosa e por isso ficou incumbida de fazer os pés e as mãos das estátuas. Além disso dava opiniões e discutia idéias sobre as obras com Rodin.” Não se sabe quando a convivência entre o mestre e a aluna se tornou um caso de amor, mas as cartas que trocavam em 1886 são reveladoras da paixão e do ciúme que Camille, desde o início, já sentia.
“Eles passam a freqüentar lugares públicos, tornando-se amantes assumidos. O que era um escândalo para a época”, Essa fase da vida de ambos é marcada por obras de intensa sensualidade. Por esculpir figuras nuas e ser amante assumida de Rodin, Camille passou então a ser rejeitada pela sociedade. Passando assim a ser vítima de um duplo preconceito, por ser mulher e também por ser escultora.
Com o tempo, Camille passou a se sentir sozinha. Vivia à espera de Rodin, que nem sempre aparecia. O relacionamento começou a deixá-la deprimida. Ela queria que Rodin se casasse com ela. Mas ele nunca chegou a deixar Rose. Jurava amor a Camille, mas dizia que não podia abandonar a mulher que havia estado ao seu lado nos momentos difíceis. Para a historiadora Monique Laurent, ex-diretora do Museu Rodin, em Paris, no entanto, isso não passava de uma desculpa. “Ele tinha medo de Camille. Sua inteligência e talento faziam dela uma artista que poderia suplantá-lo.”
Quando Rodin retorna em exclusivo e definitivo ao seu antigo amor, começa a tragédia de Camille, que se fecha em seu estúdio e se entrega a uma solidão obsessiva, caracterizada pela pobreza e pela ruína física e mental. Só sai às noites.
Em 1892, Camille decidi se afastar de Rodin.
Para recuperar o tempo perdido, se concentrou no trabalho para desvincular sua arte da do amante. É sua fase mais produtiva. Ela estuda a arte japonesa e dessa influência surgem algumas das suas mais belas obras, como As Bisbilhoteiras e A Onda. Apesar das críticas favoráveis, sua arte não era apreciada pelo grande público. “Em parte pelo preconceito por ser mulher. E, em parte, porque diziam que ela copiava Rodin”,
Sua vida está relacionada à de Rodin até 1898, quando romperam definitivamente. Depois que A Idade Madura, considerada sua obra mais autobiográfica, foi recusada pela Exposição Universal de 1900, Camille, com 36 anos, passou a achar que havia um complô de Rodin contra ela. Mas, apesar das suspeitas, ele continuava a intervir por ela, assegurando-lhe novas encomendas. Mas Camille foge de todos. Prefere viver sozinha, no silêncio e na escuridão
A partir de 1906, data da sua ultima escultura, Camille realiza em sua obra toda a dor do abandono, e num momento de cólera destrói grande parte de sua produção, numa espécie de exorcismo, como uma forma de livrar-se daquilo que ainda a vinculava ao homem amado. Os moldes de gesso ela joga no rio Sena ou os enterra, e proíbe que vejam o que faz. “A partir de então, suas angústias se tornam idéias fixas, até instalar-se a psicose”. Seu irmão estava longe, em missão diplomática na China. Seu pai estava velho, doente. Ela não tinha mais ninguém, nem dinheiro, nem saúde, nem inspiração. Restava-lhe o abandono e o medo. No dia 10 de março de 1913, uma semana após a morte do pai, a pedido da família, que arranjou uma certidão médica (ela foi diagnosticada como portadora de delírio paranóico), Camille foi levada à força para um hospício.
Rodin, por sua parte, envia-lhe algum dinheiro, expõe algumas das esculturas de Camille que sobreviveram à destruição, mas nada faz para liberá-la do hospital. De toda maneira, qualquer iniciativa sua seria dificultada pela mãe de Camille, que o considera culpado pela ruína e loucura de sua filha.
Camille Claudel morre em sua prisão psiquiátrica em 1943, com a idade de 78 anos. Esquecida do mundo, morre sem glória, sendo enterrada, anonimamente, em uma vala comum.





domingo, 18 de outubro de 2009

Desmundo

Escrito por Ana Miranda e adaptado para o cinema pelas mãos do cineasta Alain Fresnot. Ainda não tive oportunidade para Le o livro, mas o filme Desmundo é diferente de todos os filmes sobre Brasil colônia, onde a história é glorificada e embelezada. Fresnot procura mostrar o que provavelmente acontecia na época do Brasil Colonial. Percebi também uma preocupação em restituir, ou pelo menos se aproximar, aquela que teria sido a experiência de língua falada pelos habitantes daquela época, o português arcaico; incluindo falas em línguas indígenas e africanas. Para se entender alguma coisa do que é falado no filme, e necessário recorrer ao uso da legenda.

A narrativa fílmica inicia-se com um fragmento de uma carta de 1552, enviado pelo Padre Manuel da Nóbrega ao Rei D. João, solicitando órfãs do Reino para se casarem com os homens brancos da terra a fim de diminuir os “pecados da terra”, ou seja, uma tentativa de minimizar o número de filhos dos portugueses com as índias . Sob este tema se construiu a idéia do filme. O foco central do roteiro destaca o choque entre Oribela, órfã portuguesa de 16 anos, religiosa fervorosa educada em um convento e Francisco de Albuquerque, um degredado português que enriqueceu com as terras e escravos que adquiriu por aqui. Oribela, apavorada diante do mundo - “desmundo”, “não-mundo” ou fim de mundo - que não compreende e tenta, sempre que pode, fugir e voltar a Portugal. Com esse intuito se envolve com Ximeno Dias, mercador espanhol, cristão-novo. Oribela tentou fugir algumas vezes, e descobriu que o único lugar onde podia se esconder, neste mundo tão grande, era dentro dela mesmo. E que só podia contar com sua lucidez, e, às vezes, nem com isso.

O melhor de Desmundo são as imagens excepcionais dos índios sendo explorados, o tratamento escravocrata dado às mulheres, os mecanismos de escambo, o clima sombrio das primeiras vilas, a língua, a paisagem, as moradias, a alimentação, as referências à antropofagia entre os índios e o comportamento "carinhoso" de nossos catequizadores. Vale observar também as mulheres, tanto o seu conhecimento acerca do corpo e seus hábitos quanto à relação homem-mulher.

É necessário assistir, saboreando cada detalhe e diferentemente das histórias contadas por Hollywood, Desmundo tem um ritmo lento, que não glorifica nem embeleza a história, mas que remete o expectador a sintonizar-se e a problematizar uma série de questões que configuraram o início do processo civilizatório brasileiro, possibilitando, apesar da artificialidade cênica, uma reflexão para afastar um deslumbramento ingênuo que faz parte do imaginário contemporâneo à cerca deste período histórico.










quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Imagens de Frans Post do nordeste brasileiro


É considerado o mais importante artista neerlandês a serviço de Nassau na comitiva que o acompanhou ao Nordeste do Brasil em meados do seculo XVII. Chegou ao Brasil em 1637, com 24 anos de idade, e tomou parte em diversas expedições, com o objetivo de montar uma grande coleção de desenhos com motivos brasileiros para o seu mecenas. Enquanto esteve no Brasil, Frans acompanhou o Governador em suas campanhas e teve residência no Palácio das Torres. Dos seus trabalhos no Brasil, o mais importante depoimento é, contudo, o livro famoso para o qual Frans Post desenhou numerosas vistas de portos e fortificações, do Maranhão à Bahia. Embora datados de 1645, ou seja, depois do seu regresso à Europa, mostram tal segurança e exatidão topográfica que deixam bem claro terem sido copiados de telas ou esboços feitos ao natural. Da sua estadia no Brasil só existem seis quadros. São as vistas de Itamaracá, de Porto Calvo, do Forte dos Reis Magos, do rio São Francisco e da ilha de Antônio Vaz. Um sétimo quadro é mencionado em catálogos de leilões do século XVIII, correspondendo à prancha do Palácio das Torres. Mas são nos quadros do Frans Post que temos as melhores imagens das origens da casa brasileira; uma adaptação da casa rural portuguesa.


Características das casas pintadas por Frans Post
- homogeneidade das casas
- andar térreo fechado em parte.
- andar de cima com varanda, com abertura no corpo da casa em vez de varanda.
- planta quadrada ou retangular.
- eventuais galpões de madeira.
- eventuais torres laterais (casas-fortes dos primeiros colonizadores)
- ausência de vidro nas janelas.
- casas principais cobertas com telhas.






As primeiras áreas de ocupação e conquista do território brasileiro surgiram no nordeste como áreas de exploração açucareira e esse era o principal interesse português no Brasil, que se constituiu a partir da Companhia das Índias Ocidentais com a administração deNassau.

domingo, 13 de setembro de 2009

A vida nas senzalas



Os colonos portugueses costumavam interpretar a cultura africana com um olhar racista. Dessa forma eram vistos como seres inferiores, incapazes de estabelecer laços familiares estáveis e duradores. Muitas das praticas culturais dos escravos eram consideradas indecentes, extremamente sensuais e libertinas. Pois acreditavam que esses comportamentos resultavam do fato de os africanos virem de uma sociedade primitiva. Foi nas senzalas que os africanos reconstruíram o seu modo de viver. Vários africanos procuravam estabelecer uma união conjugal, pois isso significava a possibilidade de repartir com um companheiro as dificuldades do dia-a-dia e a falta de liberdade.
Os casados podiam viver separados dos outros cativos, fosse num cômodo separado dentro das senzalas ou construindo uma pequena moradia nas terras da fazenda.
Longe da vigilância constante do senhor, o casal podia preparar refeições extras com a pesca e a caça de animais silvestres, armazenarem comidas e objetos e também fabricar pequenos utensílios. Muitos escravos casados conseguiam conquistar o direito de cultivar uma pequena roça particular e mesmo criar animais de pequeno porte, como porcos e galinha.
Habitação de negros, obra de Johann Moritz Rugendas, sec.XIX

Familia de fazendeiros,
gravuras de Jean -Baptista Debret, 1835




Uma sociedade em movimento




Ao desembarcar na America, o africano imediatamente assumia a condição social mais baixa que existia na colônia: a de escravo. Não fazia diferença se na África ele tinha sido rei, príncipe ou agricultor. No extremo oposto dessa condição social estava os seus senhores, vindos da Europa ou nascidos na America.
No inicio do sec. XVI, Portugal era considerado na Europa, como uma das principais potencias; embora fosse pequeno em território e contasse com uma população minúscula. Ainda assim, esse contingente precisava ser dividido entre todas as novas conquistas ultramarinhas, pois a ocupação dessas terras era a forma de garantir a posse. Então, para o Brasil veio todo tipo de gente, de degredados ate ricos senhores.
Para o colono português, a família tinha um significado fundamental, pois viver em família garantia ao individuo uma condição social digna permitindo a ele, nutrir expectativa de progredir, ou seja, de acumular riquezas.
A casa foi à principal expressão da família. É a casa-grande foi à expressão máxima de prestigio e sucesso na economia colonial.
(...) as casas seriam, mesmo as dos grandes senhores, simples, pobres, acanhadas e vazias de objetos. Somente no decorrer do sec. XIX a riqueza passou a ser espelhada no formato e no interior das residências. (....). Foi também nesse século que o habito de usar talheres, considerado sofisticado, passou a ser usado. Antes se comia agachado ou acocorado no chão usando as próprias mãos.
(...) Na colônia, a ostentação do poder e prestigio estava na propriedade de escravos, no volume de sua produção, na riqueza dos trajes e complementos, inclusive de cativos e de arreios dos animais de montaria, quando se encontravam em espaço publico. (...) FARIA, Sheila de Castro. Nossa Historia, ano 2, n.16, fev.2005, p.60.
Nesse texto podemos perceber que o requinte e opulência atribuídos ao modo de vida dos senhores colônias do Brasil, não foram encontrados ao se realizar pesquisas mais profundas.
Nessa sociedade rural, a casa-grande era o centro da vida cultural e social. Comandada de forma absoluta pelo senhor de engenho, ali se realizavam as mais diversas atividades doméstica, cerimônias religiosas e as festas. Em seu interior conviviam de forma intensa os mais diversos personagens: parentes, trabalhadores livres, filhos ilegítimos, agregados de diversas naturezas e, os escravos domésticos.





quarta-feira, 9 de setembro de 2009

O processo de produção açucareira


A produção do açúcar era bastante complexa e envolvia muitas etapas. Em todas elas havia a utilização da mão-de-obra escrava, supervisionada, em geral, por trabalhadores livres especializados. Inicialmente o terreno era limpo com a derrubada da mata. Nesse solo desmatado, abriam-se as covas onde eram enterradas as estacas de cana para germinar. Os primeiros brotos apareciam entre 10 e 15 dias; mas a primeira safra demorava ate um ano e meio para ficar no ponto de ser colhida.
A cana era cortada, amarrada em feixes e transportada em carros de boi para a casa do engenho, onde ficava a moenda. Grandes cilindros de madeira, acionados por tração animal (engenho de trapiche) ou por força hidráulica(engenho real) moíam a cana para se extrair o caldo.
Esse caldo era fervido por horas nas fornalhas, sob a supervisão do mestre de açúcar; que acompanhava todo o processo, auxiliado por trabalhadores especializados, livres ou não.
Quando atingia o ponto certo, o melaço era posto para purgar em formas de barro, ou seja, a água era despejada lentamente sobre essas formas para clarear o açúcar, livrando-o das impurezas. Depois de purgado, os “Paes de açúcar” (assim chamados devido ao formato das formas serem igual à forma dos Paes que se fazia na época) eram separados por tipo (claro, escuro ou mascavo), triturados, encaixotados e pesados. Em seguida, eram embarcados rumo a Europa.

Engenho em Pernambuco. Desenho de Frans Post

A economia açucareira

Muitas atividades econômicas foram praticadas na America portuguesa durante os dois primeiros séculos de colonização. A produção de açúcar foi a mais importante. A escolha desse produto se deu pela experiência já adquirida nas ilhas do Atlântico e a ajuda de investimentos dos banqueiros europeus. Alem disso, havia terra farta na nova colônia, onde o açúcar podia ser produzido em larga escala.
A cana-de-açúcar foi plantada em todas as capitanias, mas só prosperou na faixa litorânea do Nordeste; devido o tipo de solo, clima úmido e quente, pela existência de rios navegáveis que facilitavam o transporte e também pela maior proximidade da metrópole.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Mudança para o novo Mundo

Um começo é sempre difícil, seja de um trabalho, de uma carta, de uma decisão ou mesmo de um novo caminho escolhido. Temos a idéia na cabeça e uma esperança que tudo vai dar certo. O medo perturba, pois sabemos que toda escolha vem acompanhada de conseqüências e são essas conseqüências que são determinantes nas nossas escolhas. Assim também foi com a família real portuguesa, no ano de 1808; quando por forças napoleônicas tiveram que transpor o Atlântico em busca de um novo começo, longe das ameaças da França, longe dos objetos e amigos; pois nem tudo e todos podiam vir. Havia duvidas, medos, interesses, conselhos; tudo foi pesado para se chegar à decisão final, aquela que repercutiria para sempre no povo brasileiro.

Temos que acreditar que cada dia será realmente um novo dia e não simplesmente uma repetição do ontem. Assim como a família real, que se deixou levar pela necessidade de transplantar no Brasil o reino português, devemos acreditar e confiar que mudanças são necessárias. Não fazendo resistência a elas, mas acreditando que quando a “poeira passar” vamos perceber que o melhor que poderia acontecer naquele momento, foi o movimento que fizemos. O mundo está sempre em movimento, mas só percebemos quando saímos do nosso.